segunda-feira, maio 30, 2005

Procurar o quê

O que a gente procura muito e sempre não é isto nem aquilo. É outra coisa.
Se me perguntam que coisa é essa, não respondo, porque não é da conta de ninguém o que estou procurando.
Mesmo que quisesse responder, eu não podia. Não sei o que procuro. Deve ser por isso mesmo que procuro.
Me chamam de bobo porque vivo olhando aqui e ali, nos ninhos, nos caramujos, nas folhas de bananeira, nas gretas do muro, nos espaços vazios.
Até agora não encontrei nada. Ou encontrei coisas que não eram a coisa procurada sem saber, e desejada.
Meu irmão diz que não tenho mesmo jeito, porque não sinto o prazer dos outros na água do açude, na comida, na manja, e procuro inventar um prazer que ninguém sentiu ainda.
Ele tem experiência de mato e de cidade, sabe explorar os mundos, as horas. Eu tropeço no possível, e não desisto de fazer a descoberta do que tem dentro da casca do impossível.
Um dia descubro. Vai ser fácil, existente, de pegar na mão e sentir. Não sei o que é. Não imagino cor, forma, tamanho. Nesse dia vou rir de todos.Ou não. A coisa que me espera, não poderei mostrar a ninguém. Há de ser invisível pra todo mundo, menos pra mim, que de tanto procurar fiquei com merecimento de achar e direito de esconder.


Carlos Drummond de Andrade - Esquecer para Lembrar
Em tempo: Drummond é outro dos meus poetas prediletos. Também merecerá sua seleção por aqui, qualquer dia desses.

domingo, maio 29, 2005

Aprenda a calar

Esse blog não recebe um post há mais de duas semanas. Acho que eu não estava lidando bem com as palavras neste período. Mas, agora que voltei a postar, preciso (re)começar com este texto. Voltei a ele hoje, merecidamente e um pouco tarde demais. Que sirva de útil lição no futuro. Pra variar um pouco, não sei o autor.

Aprenda a silenciar a palavra que sai gritada de seus lábios, ferindo a sensibilidade alheia e lhe deixando à mercê das companhias inferiores.
Aprenda a calar...
Aprenda a silenciar a palavra suave, mas cheia de ironia que sai de sua boca ridicularizando, humilhando a quem se dirige e que lhe intoxica, provocando a dor de estômago, as náuseas ou a enxaqueca.
Aprenda a calar...
Aprenda a silenciar o murmúrio que sai entre dentes, destilando raiva e rancor e atingindo o alvo, que fere como punhal ao tempo em que lhe fragiliza a ponto de não se reconhecer, de se assustar consigo mesmo.
Aprenda a calar...
Aprenda a calar o pensamento cruel que lhe passa na mente e que, por invigilância, se detém nele mais do que deveria. Você se assustaria se pudesse ver sua máscara espiritual distorcida.
Aprenda a calar...
Aprenda a calar o julgamento que extrapola o que vê e o que sabe, levando-o a conjeturar sobre o outro, o que não sabe e não viu, plasmando idéias infelizes que são aproveitadas pelos opositores daquele que é julgado.
Aprenda a calar...
Aprenda a calar todo e qualquer sentimento indigno, zelando pelas nascentes do seu coração, para que não macule e não seja maculado.
Aprenda a vigiar os sentimentos para que cada dia, mais atento e vigilante, saia da esfera mesquinha a que se aprisiona voluntariamente, e possa alçar vôos mais altos e sublimes.
Aprenda a calar...
E, enquanto não consegue deixar de gritar, falar, murmurar, pensar cruelmente e julgar, insista em orar nesses momentos. Nem que as frases lhe pareçam desconexas e vazias de sentimento.
Insista na oração até que, um dia, orará não com palavras nem pensamentos, mas todo você será sentimento, amor, amor puro e verdadeiro em ação, dinâmico, envolvendo os outros e a si mesmo, verdadeiro discípulo que conseguirá ser.
Aprenda, definitivamente, a calar!


sexta-feira, maio 13, 2005

Quase nada...

Lista de desejos

Uma casa pra morar, minha, pra ficar sozinha - ou acompanhada - quando bem quiser;
Um amor que também me ame;
Uma viagem pra fora do Rio, sempre que possível, pra me fazer sentir saudades de casa;
Um sorriso de um filho que ainda precisa ser feito;
Um mundo mais justo;
Amigos à minha volta o ano inteiro;
Menos violência e mais sorrisos;
Uma fonte de renda, porque ninguém vive de brisa, nem eu!; e
"Um prato fundo pra toda fome que há no mundo", como canta o Zeca Baleiro...

quarta-feira, maio 11, 2005

Uma poesia para o dia

Com Licença Poética
Adélia Prado

Quando nasci um anjo esbelto,
desses que tocam trombeta, anunciou:
vai carregar bandeira.
Cargo muito pesado pra mulher,
esta espécie ainda envergonhada.
Aceito os subterfúgios que me cabem,
sem precisar mentir.
Não sou tão feia que não possa casar,
acho o Rio de Janeiro uma beleza e
ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
Mas o que sinto escrevo. Cumpro a sina.
Inauguro linhagens, fundo reinos
- dor não é amargura.
Minha tristeza não tem pedigree,
já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.
Mulher é desdobrável. Eu sou.

segunda-feira, maio 09, 2005

Relacionamentos

Resolvi postar aqui um texto que escrevi no orkut e fiquei com medo de acabar perdendo.
Gostei da forma como me coloquei nele, acho que está bem coerente com o que eu penso sobre relacionamentos.

Acho que, por uma questão de cultura e velhos hábitos de criação, o homem espera uma mulher companheira, que lhe dê apoio, que esteja ao lado dele e que viva a vida dele.
Acho que os relacionamentos hoje estão mais difíceis porque as mulheres passaram a questionar esse papel, e aprenderam a querer também. Bem diferente da geração e da criação da minha mãe, que passou a vida cuidando dos filhos e do marido, sem nunca ter trabalhado, por exemplo. Hoje as mulheres querem apoio pra criar os filhos, para fazer seus mestrados, para desenvolver suas carreiras...querem ter direito às próprias escolhas e ter apoio para elas.
Muitos homens já vivem essa nova realidade, e conseguem dar e receber na mesma medida. Mas dá pra perceber por aí, principalmente nas atitudes dentro dos relacionamentos, que no DNA de vários ainda está impresso o papel do "chefe da casa".
Eles querem uma mulher companheira, mas não sabem ser companheiros também. Querem alguém que se encaixe na vida deles, apenas. E muitas de nós, mulheres, com o passar dos anos, cansadas de tanto ceder, estamos chegando nesse ponto também, de querer alguém que se encaixe.
O que eu sinceramente acho que não funciona para nenhum dos lados...
Relacionamento tem que ser uma via de mão dupla...bom para os dois, em que as duas pessoas estejam dispostas a ceder, a aprender e a crescer juntas, compartilhando e apoiando uma à outra.
Há uma sutil diferença entre pessoas que querem encontrar alguém e pessoas que querem um relacionamento. Vale a pena prestar atenção nisso...tem gente que manifesta claramente a intenção de receber, mas não a de doar.


Eu não quero cair nessa armadilha de só querer e exigir. Até porque gostar de fazer pessoas felizes, de fazer coisas pelos outros, é algo impresso no meu DNA. Mas ao mesmo tempo não estou mais tão a fim de ceder como já fiz no passado. Creio que, como eu, várias mulheres se sentem assim: está na hora de receber também.
Creio que devemos buscar o equilíbrio em um relacionamento, como em todas as áreas da vida.
Mas eu busco, principalmente, sentir no outro - antes de qualquer coisa - a capacidade de amar. E isso está no dia-a-dia, nas atitudes com a família, com os amigos, com os conhecidos e com os desconhecidos. Não está em um beijo caloroso ou em um abraço apertado. Não está nas tiradas inteligentes ou no sorriso bonito (dois aspectos que prezo muito, aliás).
Talvez este seja um bom conselho. Sinceramente, não sei. Imagino o que posso dar e me vejo no direito de escolher o que esperar.
Torço para achar alguém que queira a mesma coisa que eu, ao mesmo tempo. Isso com certeza será algo bom, seja que espécie de relacionamento for. :)

domingo, maio 08, 2005

Dia das Mães


Não dizem que uma imagem vale mais do que mil palavras?

sexta-feira, maio 06, 2005

E se...

Hoje li este texto do Luiz Fernando Veríssimo, um dos meus autores prediletos. Resolvi postar aqui por causa do tema. Não é à toa que eu nunca tenho esse tipo de pensamento, o famoso "e se...". Acredito que é totalmente inútil ficar pensando em como algo teria sido, embora como exercício de imaginação seja interessante - como prova o LFV com esse texto.

Versões 1/2

Vivemos cercados pelas nossas alternativas, pelo que podíamos ter sido. Ah, se apenas tivéssemos acertado aquele número ("Unzinho e eu ganhava a sena acumulada"), topado aquele emprego, completado aquele curso, chegado antes, chegado depois, dito "sim", dito "não", ido para Londrina, casado com a Doralice, feito aquele teste...
Agora mesmo neste bar imaginário em que estou bebendo para esquecer o que não fiz - aliás, o nome do bar é "Imaginário" - sentou um cara do meu lado direito e se apresentou.
- Eu sou você se tivesse feito aquele teste no Botafogo. E ele tem mesmo a minha idade e a minha cara. E o mesmo desconsolo.

Por quê? Sua vida não foi melhor do que a minha?
- Durante um certo tempo, foi. Cheguei a titular. Cheguei à seleção. Fiz um grande contrato. Levava uma grande vida. Até um dia...
- Eu sei, eu sei... - disse alguém sentado do outro lado dele. Olhamos para o intrometido. Tinha a nossa idade e a nossa cara e não parecia mais feliz do que nós. Ele continuou:
- Você hesitou entre sair e não sair do gol. Não saiu, levou o único gol do jogo, caiu em desgraça, largou o futebol e foi ser um medíocre propagandista.
- Como é que você sabe?
- Eu sou você se tivesse saído do gol. Não só peguei a bola como mandei para o ataque com tanta perfeição que fizemos o gol da vitória. Fui considerado o herói do jogo. No jogo seguinte, hesitei entre me atirar nos pés de um atacante e não me atirar. Como era um "herói", me atirei. Levei um chute na cabeça. Não pude mais ser goleiro. Não pude mais nada. Nem propagandista. Ganho uma miséria do INPS e só faço isso: bebo e me queixo da vida. Se não tivesse ido nos pés do atacante...
- Ele chutaria para fora.
Quem falou foi outro sósia nossa, ao lado dele, que em seguida se apresentou.

- Eu sou você se não tivesse ido naquela bola. Minha carreira continuou. Fiquei cada vez mais famoso, e agora com fama de sortudo também. Fui vendido para o futebol europeu, por uma fábula. O primeiro goleiro brasileiro a ir jogar na Europa. Embarquei com festa no Rio...
- E o que aconteceu? - perguntamos os três em uníssono.
- Lembra aquele avião da Varig que caiu na chegada em Paris?
- Você...
- Morri com 28 anos.

Bem que tínhamos notado a sua palidez.
- Pensando bem, foi melhor não fazer aquele teste no Botafogo...
- Nem sair do gol naquela bola...
- E ter levado o chute na cabeça...
- Foi melhor - continuei - ter ido fazer o concurso para o serviço público naquele dia. Ah, se eu tivesse passado...
- Você deve estar brincando - disse alguém sentado à minha esquerda.Tinha a minha cara, mas parecia mais velho e desanimado.
- Quem é você?
- Eu sou você, se tivesse entrado para o serviço público.

Vi que todas as banquetas do bar à esquerda dele estavam ocupadas por versões de mim no serviço público, uma mais desiludida do que a outra. As conseqüências de anos de decisões erradas, alianças fracassadas, pequenas traições, promoções negadas e frustração. Olhei em volta. Eu lotava o bar. Todas as mesas estavam ocupadas por minhas alternativas e nenhuma parecia estar contente. Comentei com o barman que, no fim, quem estava com melhor aspecto, ali, era eu mesmo. O barman fez que sim com a cabeça, tristemente. Só então notei que ele também tinha a minha cara, só com mais rugas.
- Quem é você? - perguntei.
- Eu sou você, se tivesse casado com a Doralice.
- E?
Ele não respondeu. Só fez um sinal, com o dedão virado para baixo.

terça-feira, maio 03, 2005

Mario Quintana

Corrigindo a tremenda injustiça de não ter Quintana por aqui até hoje!

DA DISCRIÇÃO
Não te abras com teu amigo
Que ele um outro amigo tem.
E o amigo de teu amigo
Possui amigos também.

TROVA
Eu agora - que desfecho!
Já não penso mais em ti...
Mas será que nunca deixo
De lembrar que te esqueci?

AMIZADE
Quando o silêncio a dois não se torna incômodo.

AMOR
Quando o silêncio a dois se torna cômodo.

Depois de cada ilusão perdida,
que extraordinária sensação de alívio!

DESPEDIDA
Ó mocidade, adeus! Já vai chegar a hora!
Adeus, adeus...Oh! Essa longa despedida...
E sem notar que há muito ela se foi embora,
Ficamos a acenar-lhe toda a vida...

OUTRA OPORTUNIDADE
E se me dessem - um dia - uma outra oportunidade,
eu nem olhava o relógio
seguia sempre em frente...
e iria jogando pelo caminho a casca dourada e inútil das horas.

OS CHATOS
Existem duas espécies de chatos: os chatos propriamente ditos
E os amigos, que são os nossos chatos prediletos.

Buscas a perfeição? Não sejas vulgar...
A autenticidade é muito mais difícil.

AGORA
Em que mundo? Em que outro mundo vim parar?
Agora, apenas a tua voz nas minhas veias corre...
e o teu olhar ainda ilumina meu quarto.

MOVIMENTO
Nossos gestos eram simples e transcedentais.
Não dissemos nada
nada de mais...
Mas a tarde ficou transfigurada
- como se Deus houvesse mudado
imperceptivelmente
um invisível cenário.

ELEGIA
Ah, se houvesse uns passos, ainda que fossem solitários...
Se houvesse alguém andando sozinho...e bastava!
São os passos
- são os passos que fazem os caminhos.

SEMPRE QUE CHOVE
Sempre que chove
Tudo faz tanto tempo...

O vinho melhor é aquele que tu bebes calmamente na
companhia do teu mais velho e silencioso amigo.

Se um outro mundo existe, nada adiantaria ires para lá,
porque, como aqui, nada compreenderás...

segunda-feira, maio 02, 2005

Só pra deixar uma frase

"No one has a right to consume happiness without producing it." - Helen Keller

No nosso idioma: ninguém tem direito a consumir felicidade se não produzi-la.
Acho que isso serve pra muito mais coisas. Às vezes é muito mais fácil pedir do que fazer.
Mas, falando de felicidade especificamente, vejo isso em muitas pessoas. Parece tão mais fácil reclamar da infelicidade do que simplesmente tentar ser feliz!
É algo a se pensar. Até eu de vez em quando caio nessa armadilha...